Não é novidade ver e ouvir os absurdos que os grandes meios de comunicação do país veiculam sobre os Movimentos Sociais. Só nesse início de ano já foi possível perceber o quanto a sociedade civil, organizada e articulada em rede, precisa se movimentar muito mais pra mudar essa atual conjuntura da comunicação no Brasil. Vou citar aqui apenas três coisas que acredito servirem para nos deixar com mais vontade ainda de continuar (e fortalecer) a luta.
A revista Veja (Edição de 28 de janeiro de 2009) trouxe um editorial com o título “25 anos de crime e impunidade”. Referindo-se ao MST, o texto diz que “eles se abrigam sob a bandeira de uma organização política com o nome de Movimento dos Sem-Terra... eles se disfarçam de defensores da reforma agrária... as ações criminosas dessa força do atraso no campo não conseguiram fazer grandes estragos no exuberante desempenho do agronegócio brasileiro”. Encerra-se o editorial com a afirmação de que “É do maior interesse de todos os brasileiros que a ousadia e a impunidade do movimento dos Sem-Terra tenham um fim imediato”. Traz também uma foto de manifestantes com bandeira, foice e facão e uma legenda que começa com a expressão “Terror rural”. Lá pelo meio da revista, cinco páginas, com o título principal “O manual da Guerrilha”, só reforçam nossa indignação diante da postura desse meio de comunicação e da atuação das/dos profissionais que atuam no mesmo.
Ainda na mesma edição, inclusive como capa, o Aborto (e não a legalização ou não do mesmo) é colocado em destaque. São 10 páginas destinadas ao assunto, numa reportagem que ouve médicos - que assumem realizar o aborto em suas pacientes - e mulheres - que já praticaram e hoje se arrependem ou discordam da prática. Dentre essas mulheres, aparece a modelo e atriz Luiza Brunet (ocupando mais da metade de uma página) que abortou aos 17 anos e agora afirma ser contra o aborto. Em nenhum momento, o texto fala das questões de saúde pública que estão por trás dessa discussão, muito menos das diferenças (classe, etnia, etc) que devem ser evidenciadas na apresentação dos dados estatísticos que tratam do aborto no país.
Outra que também andou causando revolta foi a revista Época (Edição de 02 de fevereiro de 2009). Depois de apresentar uma reportagem de cerca de 5 páginas sobre o Fórum Econômico que aconteceu em Davos/Suíca, traz uma matéria (?) sobre o Fórum Social Mundial, ocorrido em Belém/PA. O título: “Enquanto isso, na quente Belém...” antecede um subtítulo que já é o começo de uma crítica ao Governo Federal que fez investimentos no Fórum e em especial ao presidente Lula, que participou do mesmo ao lado de outros presidentes da América Latina . A cada linha identifica-se a clara intenção de descaracterizar o caráter e a finalidade do Fórum Social. Trechos como “De ONG´s as mais variadas (incluindo uma união de prostitutas indianas, por exemplo)... todos festejaram os efeitos da crise econômica mundial” e “a temporada da turma no spa ideológico” são apenas alguns entre tantos absurdos que podem ser destacados no texto.
No dia 19 de fevereiro, a Rede Globo de Televisão, veiculou no Jornal Hoje uma reportagem que, certamente, serviu pra encorajar ainda mais aquelas e aqueles que defendem e constroem a comunicação comunitária nesse país. Vítimas constantes da repressão do Estado, as Rádios Comunitárias foram, mais uma vez, tratadas como “Rádios piratas que interferem na comunicação de aviões”. Só pelo tom de voz e a expressão facial da apresentadora Sandra Annemberg ao ler a “cabeça” da reportagem de César Galvão, já dá vontade de está do lado de milhares de telespectadores pra dizer: Não é bem assim, isso é mais uma forma de criminalizar os veículos comunitários. Porém, neste caso, a reportagem chama atenção para a mais séria das questões que envolvem a realidade das rádios comunitárias hoje no Brasil: o uso que é feito das mesmas. As gravações de trechos da programação das rádios, exibidas pelo Jornal Hoje, reforçam o quanto é preocupante a grade de programação desses veículos. Mesmo considerando a intenção da TV Globo em construir a pior imagem das RadCom´s e as possibilidades dos recursos jornalísticos utilizados pra isso, não se pode deixar de pontuar esse problema que sabemos existir.
E é nisso, portanto, que podemos interferir. Se nós, cidadãos e cidadãs comprometidos/as com a transformação social, não tomarmos consciência de que é preciso atuar constantemente contra essa mídia, ela irá se apropriar, cada vez mais, das milhares de consciências espalhadas pelo campo e pelas cidades do Brasil.
É preciso estarmos presentes nas salas de aula, como estudantes ou como professores, na defesa de uma qualidade educacional, de uma formação crítica e ética, comprometida com a função social que cada profissão ocupa no processo de mudança de uma sociedade até então desigual. É imprescindível também iniciar a discussão da Democratização da Comunicação nas escolas, comunidades e nos Movimentos Populares diversos. Além disso, é mais do que urgente pautar essa discussão onde já existam iniciativas de comunicação alternativa e popular, uma vez que a prática nem sempre condiz com o verdadeiro propósito da comunicação comunitária.
Por meio da educomunicação e da leitura crítica dos instrumentos midiáticos, é possível sim combater as opressões citadas ao longo desse texto e tantas outras existentes na sociedade em que vivemos. Assim, estaremos em conflito com o capital e com grandes chances de vencê-lo.
Por Érica Daiane
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